O Lavador de Pedra
A gente morava no patrimônio de Pedra Lisa. Pedra Lisa era um arruado de 13 casas e o rio por detrás. Pelo arruado passavam comitivas de boiadeiros e muitos andarilhos. Meu avô botou uma Venda no arruado. Vendia toucinho, freios, arroz, rapadura e tais. Os mantimentos que os boiadeiros compravam de passagem. Atrás da Venda estava o rio. E uma pedra que aflorava no meio do rio. Meu avô, de tardezinha, ia lavar a pedra onde as garças pousavam e cacaravam. Na pedra não crescia nem musgo. Porque o cuspe das garças tem um ácido que mata no nascedouro qualquer espécie de planta. Meu avô ganhou o desnome de Lavador de Pedra. Porque toda tarde ele ia lavar aquela pedra.
A Venda ficou no tempo abandonada. Que nem uma cama ficasse abandonada. É que os boiadeiros agora faziam atalhos por outras estradas. A Venda por isso ficou no abandono de morrer. Pelo arruado só passavam agora os andarilhos. E os andarilhos paravam sempre para uma prosa com o meu avô. E para dividir a vianda que a mãe mandava para ele. Agora o avô morava na porta da Venda, debaixo de um pé de jatobá. Dali ele via os meninos rodando arcos de barril ao modo que bicicleta. Via os meninos em cavalo de pau correndo ao modo que montados em ema. Via os meninos que jogavam bola de meia ao modo que de couro. E corriam velozes pelo arruado ao modo que tivessem comido canela de cachorro. Tudo isso mais os passarinhos e os andarilhos era a paisagem do meu avô. Chegou que ele disse uma vez: Os andarilhos, as crianças e os passarinhos têm o dom de ser poesia.
Dom de ser poesia é muito bom!
Manoel de Barros. Memórias inventadas: a infância.
São Paulo: Planeta do Brasil, 2003.
Manoel Wenceslau Leite de Barros nasceu em Cuiabá (MT) no Beco da Marinha,
beira do Rio Cuiabá, em 19 de dezembro de 1916, filho de João Venceslau Barros, capataz
com influência naquela região. Mudou-se para Corumbá (MS), onde se fixou de tal forma
que chegou a ser considerado corumbaense. Atualmente mora em Campo Grande (MS). É
advogado, fazendeiro e poeta.
quarta-feira, 24 de abril de 2013
Textos de memórias literárias-Por parte de pai
Trecho do texto: Por parte de pai
Minha cama ficava no fundo do quarto. Pelas frestas da janela soprava um vento resmungando, cochichando, esfriando meus pensamentos, anunciando fantasmas. As roupas, dependuradas em cabides na parede, se transfiguravam em monstros e sombras. Deitado, enrolado, parado imóvel, eu lia recado em cada mancha, em cada dobra, em cada sinal. O barulho do colchão de palha me arranhava. O escuro apertava minha garganta, roubava meu ar. O fio da luz terminava amarrado na cabeceira do catre. O medo assim maior do que o quarto me levava a apertar a pera de galalite e acender a luz, enfeitada com papel crepom. O claro me devolvia as coisas em seus tamanhos verdadeiros. O nariz do monstro era o cabo do guarda-chuva, o rabo do demônio o cinto do meu avô, o gigante, a capa “Ideal” cinza para os dias de chuva e frio. Então, procurava distrair meu pavor decifrando os escritos na parede, no canto da cama, tão perto de mim. Mas era minha a dificuldade de acomodar as coisas dentro de mim. Sobrava sempre um pedaço...
Bartolomeu Campos Queirós. Por parte de pai.
Belo Horizonte: RHJ, 1995. Escrito, aos 46 anos.Bartolomeu Campos Queirós dedica seu livro Por parte de pai ao registro literário de suas recordações de menino. Portanto, um livro de memórias literárias. Como vimos nesse trecho do livro de Bartolomeu, é comum encontrar em textos de memórias literárias — o autor como personagem- narrador da história. Ele tomou como ponto de partida experiências que viveu quando criança, mas não se prendeu a elas. Ao recriar seu passado, procura transportar os leitores para o tempo e para o espaço onde ocorreram os acontecimentos narrados.
Transplante de Menina
[...] Na Avenida Rio Branco, reta, larga e imponente,
embicando no cais do porto [...] tivemos a nossa primeira impressão – e que
impressão! – do carnaval brasileiro. [...] O que nós vimos, no Rio de Janeiro,
não se parecia com nada que eu pudesse sequer imaginar nos meus sonhos mais
desvairados.
Aquelas multidões enchendo toda a avenida, aquele “corso”
– desfile interminável e lento de carros, para-choque com para--choque, capotas
arriadas, apinhados de gente fantasiada e animadíssima.
Todo aquele mundaréu de homens, mulheres, crianças, de
todos os tipos, de todas as cores, de todos os trajes – todos dançando e
cantando, pulando e saracoteando, jogando confetes e serpentinas que chegavam
literalmente a entupir a rua e se enroscar nas rodas dos carros... E os
lança-perfumes, que que é isso, minha gente! E os “cordões”, os “ranchos”, os
“blocos de sujos” – e todo o mundo se comunicando, como se fossem velhos
conhecidos, se tocando, brincando, flertando – era assim que se chamavam os namoricos
fortuitos, a paquera da época –, tudo numa liberdade e descontração incrí veis,
especialmente para
aqueles tempos tão recatados e comportados...
[...] Vi muitos carnavais depois daquele, participei
mesmo de vários, e curti-os muito. Mas nada, nunca mais, se comparou com aquele
primeiro carnaval no Rio de Janeiro, um banho de Brasil, inesquecível...
Tatiana
Belinky. Transplante de menina.
São Paulo: Moderna, 2003
Tatiana Belinky (Petrogrado, 18 de março de 1919) é uma das mais importantes escritoras infanto-juvenis contemporâneas. É autora de mais de 250 livros voltados para este público. Nascida na Rússia, chegou ao Brasil com dez anos de idade. Recebeu a cidadania brasileira e está radicada em São Paulo há mais de oitenta anos. .
Tatiana Belinky (Petrogrado, 18 de março de 1919) é uma das mais importantes escritoras infanto-juvenis contemporâneas. É autora de mais de 250 livros voltados para este público. Nascida na Rússia, chegou ao Brasil com dez anos de idade. Recebeu a cidadania brasileira e está radicada em São Paulo há mais de oitenta anos. .
domingo, 14 de abril de 2013
Para saber mais- diferença em "memória" e "memórias"
Segundo o Dicionário Houaiss da língua portuguesa, memória é
“aquilo que ocorre ao espírito como resultado de experiências já vividas; lembrança, reminiscência”.
No mesmo dicionário, encontramos para memórias: “relato que alguém faz, muitas vezes na forma de obra literária, a partir de acontecimentos históricos dos quais participou ou foi testemunha, ou que estão fundamentados em sua vida particular”.
“aquilo que ocorre ao espírito como resultado de experiências já vividas; lembrança, reminiscência”.
No mesmo dicionário, encontramos para memórias: “relato que alguém faz, muitas vezes na forma de obra literária, a partir de acontecimentos históricos dos quais participou ou foi testemunha, ou que estão fundamentados em sua vida particular”.
Gênero “Memórias literárias”-Toda Memória tem uma história
A vida não é a que a gente viveu, e sim a que
a gente recorda, e como recorda para contá-la. Gabriel García Márques
Queridos alunos do 3º ano do Ensino Médio turno matutino do Colégio Polivalente de Conceição do Coité,
Estamos dando continuidade ao projeto de Memórias e, portanto, seguem mais dados sobre o mesmo:
Memórias literárias geralmente são textos produzidos por escritores que, ao rememorar o passado, integram ao vivido o imaginado. Para tanto, recorrem a figuras de linguagem, escolhem cuidadosamente as palavras que vão utilizar, orientados por critérios estéticos que atribuem ao texto ritmo e conduzem o leitor por cenários e situações reais ou imaginárias.
As narrativas, que têm como ponto de partida experiências vividas pelo autor no passado, são contadas da forma como são lembradas no presente.
2ª oficina- 1ª etapa- Conversa com os idosos
Os alunos podem iniciar o contato perguntando a essas pessoas se teriam disponibilidade para conversar, emprestar objetos e fotos antigas, contar as lembranças que têm do lugar. Para isso, podem fazer-lhes perguntas como:
Atenção!
O registro é importante. Anotem o maior número possível de informações durante a conversa com a pessoa escolhida.
Em classe, reunidos em pequenos grupos, os alunos devem contar o que ouviram e relatarem o que sentiram ao ouvi-lo, o que consideraram mais interessante na forma como o depoimento foi dado.
2ª - etapa
Vestígios do passado
Fotografias antigas ajudam a recuperar lembrancas do passado. Por isso, devem fazer uma pesquisa na comunidade para localizar e pegar emprestado esse material.
Coletar com parentes e vizinhos fotos antigas, não só da cidade
como de seus moradores, em espaços públicos como prefeitura, casa da cultura, igrejas e até mesmo em estabelecimentos comerciais.
Esse recurso é importante para que possam ampliar o repertório em relação a costumes, hábitos, paisagem, formas de agir, de vestir, características de outros momentos da história do lugar onde vivem.
Pergunte aos alunos se eles têm em casa objetos antigos guardados
pela família. Podem trazer cartas, utensílios domésticos, ferramentas, máquinas antigas, roupas, discos ou algum outro
objeto mencionado pelo entrevistado.
As fotos e os objetos são elementos importantes para promover a aproximação com o passado, mas as pessoas são as principais fontes de memória; na verdade, a mais rica delas.
Fonte:
http://escrevendo.cenpec.org.br/Em breve a 3ª - etapa
a gente recorda, e como recorda para contá-la. Gabriel García Márques
Queridos alunos do 3º ano do Ensino Médio turno matutino do Colégio Polivalente de Conceição do Coité,
Estamos dando continuidade ao projeto de Memórias e, portanto, seguem mais dados sobre o mesmo:
Memórias literárias geralmente são textos produzidos por escritores que, ao rememorar o passado, integram ao vivido o imaginado. Para tanto, recorrem a figuras de linguagem, escolhem cuidadosamente as palavras que vão utilizar, orientados por critérios estéticos que atribuem ao texto ritmo e conduzem o leitor por cenários e situações reais ou imaginárias.
As narrativas, que têm como ponto de partida experiências vividas pelo autor no passado, são contadas da forma como são lembradas no presente.
2ª oficina- 1ª etapa- Conversa com os idosos
- Individualmente ou em pequenos grupos conversar com pessoas mais velhas. Podem ser pessoas da própria escola ou de casa – um vizinho, um parente...
Os alunos podem iniciar o contato perguntando a essas pessoas se teriam disponibilidade para conversar, emprestar objetos e fotos antigas, contar as lembranças que têm do lugar. Para isso, podem fazer-lhes perguntas como:
- O(a) senhor(a) se lembra de alguma passagem marcante da sua vida nesta cidade? Que fato é esse? Por que ele foi marcante?
- O(a) senhor(a) tem algum objeto antigo ou foto que lembre essa passagem de sua vida?
Atenção!
O registro é importante. Anotem o maior número possível de informações durante a conversa com a pessoa escolhida.
Em classe, reunidos em pequenos grupos, os alunos devem contar o que ouviram e relatarem o que sentiram ao ouvi-lo, o que consideraram mais interessante na forma como o depoimento foi dado.
2ª - etapa
Vestígios do passado
Fotografias antigas ajudam a recuperar lembrancas do passado. Por isso, devem fazer uma pesquisa na comunidade para localizar e pegar emprestado esse material.
Coletar com parentes e vizinhos fotos antigas, não só da cidade
como de seus moradores, em espaços públicos como prefeitura, casa da cultura, igrejas e até mesmo em estabelecimentos comerciais.
Esse recurso é importante para que possam ampliar o repertório em relação a costumes, hábitos, paisagem, formas de agir, de vestir, características de outros momentos da história do lugar onde vivem.
Pergunte aos alunos se eles têm em casa objetos antigos guardados
pela família. Podem trazer cartas, utensílios domésticos, ferramentas, máquinas antigas, roupas, discos ou algum outro
objeto mencionado pelo entrevistado.
As fotos e os objetos são elementos importantes para promover a aproximação com o passado, mas as pessoas são as principais fontes de memória; na verdade, a mais rica delas.
Fonte:
http://escrevendo.cenpec.org.br/Em breve a 3ª - etapa
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